Na aula passada lemos em classe um material relativamente difícil de Rodrigo Duarte, chamado Barroco: lastros ideológicos e antecipações utópicas. A professora nos pediu para procurar sobre os autores que são mencionados no material, como Alois Riegl e Heinrich Wölfflin, este último considerado o pai das teorias genético-formais do barroco. Wölfflin caracterizou a arte seiscentista como aberta por evadir-se das regras clássicas da composição, violando ou dissimulando seus ideais de proporção, equilíbrio, estaticidade, simetria, harmonia entre verticais e horizontais, centralidade, racionalidade etc.
A arquitetura barroca se caracteriza pela liberação espacial das convenções geométricas e históricas, do estático, da simetria e da antítese entre espaço interno e espaço externo, alcançando uma liberdade, uma atitude criadora liberada de preconceitos intelectuais e formais. Essa liberdade frente à ideia de mímesis e à tradição clássica obedece somente à subjetividade do artista autônomo que se impõe sobre os sistemas preestabelecidos.
Então, forma-se um novo estatuto de beleza no século XVII: o belo não mais surge da perfeita realização das leis da arquitetura clássica, mas da utilização e da interpretação que o arquiteto faz delas. O edifício é belo não pelas figuras que ele emprega, mas pelo modo como são empregadas, podendo não só igualar, mas, inclusive, superar o conceito clássico de belo. Não existe mais um arquétipo, mas sim uma arche-poiesis. Como não interessa mais ao arquiteto copiar o modelo histórico, também não lhe interessa copiar o modelo natural: mais do que a forma formada, ele imita a formação do mundo, o gesto criador, a atividade produtora do universo mesmo. O arquiteto, portanto, recolhe a história e a natureza não para imitá-las, mas para submetê-las e ordená-las segundo um processo pessoal, diferente e íntimo, utilizando-se delas para elaborar uma nova síntese que exprima o poder de sua subjetividade. à esteticidade do clássico, o século XVII contrapões a articidade barroca.
Essa definição do Barroco me fez ter novos olhos sobre uma igreja que visitei por acaso há muitos anos atrás.
Era julho de 2007. Eu e meu marido estávamos em uma viagem de moto entre o Mato Grosso do Sul ao Rio de Janeiro. Dias antes tínhamos esbanjado parte das nossas férias na cidade de Bonito, no Mato Grosso do Sul. De lá, terminaríamos nossas férias em Arraial do Cabo, no Rio de Janeiro.
Durante a passagem pelo estado de Minas Gerais, resolvemos sair da estrada para esticar as pernas e tomar um café. Por acaso, entramos na cidade de Congonhas, e a imagem que me lembro é exatamente a da foto abaixo, que encontrei na internet. Um terreno íngrime, pequenas casinhas que pareciam contar histórias com sua arquitetura, e uma igreja ao fundo.
Ao nos aproximarmos das vielas da cidade, perdi de vista a Igreja. Pedi então para o meu marido para nos dirigirmos até o centro da cidade, onde estava estabelecida a igreja, para tirar algumas fotos.
Não sei o que me fez ser atraída pela igreja, mas ela parecia emanar uma mistura de imponência e dramaticidade. As estátuas ao redor da igreja tinham rostos com detalhes marcantes, e posicionados na entrada da igreja como se fossem guardiões.
Ao ler o material sobre a arquitetura barroca, lembrei-me dessa igreja. Em uma pesquisa rápida na internet, descobri que as esculturas em tamanho real foram esculpidas por Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.
A planta da igreja segue o modelo barroco colonial, com uma nave única, um coro sobre a entrada e uma capela-mor separada da nave por um arco monumental.
A igreja é um exemplar da arquitetura colonial brasileira, com decoração interna em talha dourada e pinturas. O adro é ornado com doze estátuas de profetas em pedra-sabão e as capelas contêm grupos escultóricos em madeira policromada que representam passos da Paixão de Cristo, estátuas criadas pelo Aleijadinho e seus assistentes. O conjunto foi construído durante o século XVIII.
Sua implantação cenográfica e monumental, seguindo o modelo dos “sacro montes” europeus, não tem paralelos no Brasil à sua altura, e as capelas e o adro abrigam a parte mais relevante do legado escultórico do Aleijadinho. O Santuário é também o centro de uma das mais populares devoções do país, recebendo milhares de peregrinos todos os anos e recolhendo enorme coleção de ex-votos. Tornou-se um ícone do Barroco brasileiro e do estado de Minas Gerais, e uma grande atração turística. Devido à sua superior importância histórica, social e artística, o conjunto foi tombado em 1939 como patrimônio histórico nacional.
“Como artista que desenvolveu um estilo original, abandonando a imitação provinciana dos precedentes europeus, o Aleijadinho se torna uma figura de importância não só para o Brasil, mas para todo o continente americano. Com efeito, pode ser considerado o pioneiro que expressou em sua arte, na maneira mais vigorosa, mais impressionante e mais decisiva, a emancipação do Novo Mundo em relação ao Velho”. (Jonh Bury)
Há cerca de um ano atrás, a cidade de Congonhas ficou em alerta sobre a possibilidade do rompimento de uma barragem existente nas cercanias da região, cuja administração é da companhia CSN. Os moradores da cidade têm motivos para temer, afinal vivem à sombra do maior desastre ambiente do Brasil ocorrido dois anos antes: Mariana.
Espero que essa herança do período Barroco não seja engolida pelas águas, tal qual aconteceu com parte da história brasileira que estava guardada do Museu Nacional no RJ. Mas, neste último, ao invés das águas, foram as chamas.